terça-feira, 7 de julho de 2009

O Maquinista





Quando,
à hora do Jazz,
a minha cabeça rola
pelo tecto pintado do café,
a parede em frente é uma visão de escola
onde um menino de bibe e gola
sonha com aquilo que não é.

E até os criados
têm ares purificados
como ascetas dum branco ritual.
E os mármores das mesas,
com desenhos obscenos,
surdinam vagas rezas...

E as garrafas dos álcoois e absintos,
em garbos áticos,
oferendam viáticos...

E há toalhas brancas e há velas acesas!

E ela vem sempre
(só a cabeça dela,
que o corpo
perdeu-o, porventura,
nalgum escuro quarto de aluguer).
Ela vem sempre,
como naquele dia,
serena e amavia,
única e excepcional.

O pianista
comeu os dentes do piano
e canta, de pernas para o ar,
uma canção azul.
O violinista adormeceu em pé numa cadeira
e o violino dá som sem ninguém lhe tocar.

E ela vem sempre
como naquela hora
estranha, delicada
e debruada a encanto.
Pura como a água, suave como um manto.

O dia é Dia Santo...





Saul Dias

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